Com cinco prêmios Grammy Latino na mala, Lenine já embarcou pra longe. E
entre Pernambuco e Paris acumulou referências. Colocou muitas delas em Chão,
expondo-se, sem medos, pela primeira vez em quase três décadas.
Lenine aparece falando em francês
ao subir no palco para passar o som como se não houvera abandonado o tempo em
que gravou um concerto na Cité de La Musique, em Paris. Mas, para os
desatentos, a quadra agora é outra. Uma época de muito mais intimidade, por
assim dizer. É momento de Chão, de expor foto de família na capa do disco, de
gravar em casa, experimentar dividir os palcos com o filho Bruno Giorgi. De se
reinventar, enfim.
O pernambucano está beirando ou
30 anos de carreira e de idade tem 52. Já arrebatou cinco prêmios Grammy Latino
e com essa bagagem lança o décimo disco, que recomenda ser ouvido como uma
talagada só, ignorando a fragmentação dos álbuns na internet. Ele que não se
curva ao que é imposto pela rede, sobretudo quando se trata de downloads
gratuitos.
“O problema é que o universo é
tão novo e tão amplo que a gente não sabe para onde vai. A ferramenta é tão
amorfa e cheia de possibilidades que a gente não sabe como usar ainda. Agora
uma constatação eu posso te dar: não me peça de graça a única coisa que eu
tenho pra vender.”
Lenine vive de arte, vende
cultura, música da melhor qualidade. Faz questão de deixar as regras claras,
não faz questão de discos convencionais. Chão tem módicos 28 minutos e músicas
conectadas por sons ambientes. São ruídos dos mais variados, todos capturados
de forma natural e sem edição. É por tudo isso que o cantor define o trabalho
como “íntimo e orgânico”.
Intimidade
Lenine revela que sempre só foi
até a página oito por opção. Depois da página oito eu não abria pra ninguém. Trabalho
e vida pessoal sempre estiveram em degraus diferentes até a chegada de Chão.
“Quando eu resolvi fazer o disco
e constatei que se chamaria Chão, aquela foto não foi tirada, aquilo é do meu
álbum de família. Eu estava realmente dormindo, com meu neto no colo e a minha
mulher, portanto a avó dele, chegou de noite, sem nos acordar e clique, com só
uma luz em infravermelho. Então eu achei honesto com o projeto todo, com essa
intimidade toda, com essa organicidade eletrônica, que é quase paradoxal,
porque o disco é extremamente eletrônico, mas extremamente orgânico também. Foi
por isso tudo que eu me expus dessa maneira. Mas eu tenho a sensação de que o
Chão é o disco e o trabalho em que eu estou mais nu.”
“Eu sou um homem de sorte porque fui criado por duas pessoas
extremamente visionárias e generosas.
Dona Deise e Seu Geraldo. Me deram prumo, uma capacidade de julgamento e me
deram mais do que tudo, exemplo de generosidade."
Ruídos
O primeiro som a vazar foi o do
canário belga da avó de Bruno, seu filho, que vive em uma casa na Urca, onde há
um estúdio de gravação. A gravação em que Frederico aparece é a faixa “Amor é
pra quem ama”. “É também um disco mais romântico, porque o amor está permeando
toda a minha vida. E chão sendo o que me sustenta, o que me mantém é o amor.
Por mais piegas que isso possa parecer, não há caminho a trilhar sem amor.”
As descobertas entretiveram o
artista, como se pode ver a seguir. “Foi muito divertido gravar a chaleira,
procurar o tom da chaleira, abrindo e fechando o gás. Foi muito divertido dar
passos em volta do meu orquidário e construir depois a música por cima dos
passos e não o inverso. Foi muito divertido gravar o coração do meu filho. E a
gente teve de colocar uma flanela. Teve todo esse processo que é muito íntimo,
mas que eu acho que está evidente no disco todo, pelo silêncio e pela pausa que
permeiam o processo todo.”
Tudo começou quando Lenine,
sentindo-se numa posição muito cômoda, começou a suspeitar de tudo. “Eu sempre
sou levado a ir mais alem. Eu acho que é de índole, de curiosidade, porque cada
vez que eu estou numa posição muito cômoda, eu começo a desconfiar de tudo.”
Essa desconfiança o fez pensar em um trabalho diferente dos demais. Não teria
bateria ou percussão, o que lhe permitiu descobrir tantos novos relevos
sonoros.
Na hora de transpor para o palco,
rapidamente descobriu que teria de adaptar ao surround -o tipo de equipamento encontrado
no cinema, em que os sons vem de todas as direções. Então, Chão ganhou essa
tridimensionalidade. “Está sendo uma experiência maravilhosa não só pra mim,
mas pra toda a equipe”, conclui.
Fotos: Ramón Vasconcelos
*Matéria publicada na revista LivingFor. Texto e fotos contém direitos autorais.
Um comentário:
Lenine é um grande cara, um grande artista brasileiro, uma enorme referência em meu projeto musical tb. Convido todos aqueles que tb acham o trabalho do cara muito interessante, a darem uma olhada no meu trabalho.Obrigada e salve Lenine!
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