sexta-feira, 4 de julho de 2008

Disfarces

Passaram-se cinco anos até que dois amigos se reencontram. Em um tinham aparecido os primeiros cabelos brancos, e na cabeça outro já quase não havia fios. Um tinha perdido o abdômen rígido conquistado nas classes de judô enquanto o outro deixou de lado uns poucos quilos indesejáveis. Desejados os dois eram. Agora por suas esposas e filhos.
Na mesa de um bar, o papo clichê de rememorações e digressões atropelando as falas. Os copos, na maior parte do tempo, quase vazios. Eram rápidos e dentro de pouco mais de uma hora estavam ligeiramente bêbados. Nostálgicos, alegres, de pileque.
Como nas noites de outrora, terminaram por encontrar o caminho do Mangueirão. A casa noturna nas entocas do Parque das Colinas, ao contrário, tinha mudado pouco. De atualizações só uma radiola de fichas na sala principal, os azulejos do bar e a variedade de drinques e as putas de dona Magali, claro.
Aliás, a safra era nova, mas permanecia com as mesmas características. Só havia duas meninas jovens, que àquela altura tinham se trancado nos quartinhos um par de vezes cada uma. As demais eram de meia idade. Usavam um vocabulário chulo e pinturas multicoloridas borradas na cara. Tinham o eterno ar de decadência dos bordéis que usam luz negra debaixo do céu.
Chegaram perto de Keith e fizeram a proposta ao pé da orelha. Ela topou, mas pediu espaço para mostrar seus dotes no palco. A eles e aos demais frequentadores. Era cortesia. Subiu no palco envolto por espelhos cortados e tirou a roupa sem frescuras, parando ainda no meio da música. Desceu sem ouvir aplausos e pegou os dois pelas mãos.
Sem roupas, nada mais abrir a porta deitou com as pernas bem afastadas num exibicionismo latente. Vinícius já estava sem conseguir esconder sua excitação dentro das calças frouxas de tecido fino. Marcos também sentiu desejo pelo inusitado.
Quando foi puxado pela cintura pela meretriz seu amigo já estava em pêlos. Sentiu um nervosismo abrupto e que iria brochar. Ainda vestido conseguiu disfarçar e cedeu a vez sem moléstias para ambos.
Keith sequer se mexia enquanto era tomada pelo vigor de Vinícius. Ele estava pro cima, na clássica posição do Kama Sutra, de costas para seu amigo, parado pouco mais de um metro dali.
Marcos ficou a admirar o corpo do companheiro ao invés do da acompanhante. Ele tinha a bunda mais lisa que a dela. E com as mãos menos calejadas do que na época da adolescência, começou a se masturbar. Assumiu-se voyeur. Os três gozaram juntos. E o desejo contido de Marcos foi parcialmente saciado. Sem levantar suspeitas.

Um comentário:

Luis Fabiano Teixeira disse...

Muito bacana a forma como vc escreve, uma linguagem bem enxuta, visual (a minha memória é visual, então logo me detenho a esses detalhes aparentemente insignificantes como os do "azulejos"). E particularmente esse conto ou crônica (pra que definições?) lembra um pouco "Aqueles Dois" do Caio F. Abreu, mas com um final bem mais surpreendente. Bem, parabéns! Assim que eu arrumar o meu "Mundo Imaginário", vou deixar o seu link lá também. Abração!