*Trecho da
música "Você não soube me amar",
composta por Evandro Mesquita, Ricardo Barreto, Guto Barros e Zeca Mendigo
Com um ukulele a tiracolo,
Evandro Mesquita mete a boca no trombone, tira onda e defende que muito antes
de Jack Johnson já tinha uma pegada de litoral no seu estilo de cantar. E
também mete o bedelho na arte de outros, criticando os jovens atores que se dão
bem com um modelo cansado de stand-up comedy.
O som era pop rock, mas as entradas declamatórias de Evandro Mesquita,
em paradas bruscas nas músicas, deixaram muito claro o novo estilo que se
misturava no verão de 1982 e no primeiro LP da banda Blitz. Usando a principal
característica do samba de breque, eram jogadas as frases que transitavam entre
a graça e a malandragem tipicamente carioca que o grupo queria imprimir.
Passados 30 anos do lançamento de “Você não soube me amar”, quem vê o líder do grupo andando com um
pequeno instrumento de cordas pode, inadvertidamente, achar que mais de samba se
encalacrou, seguindo o movimento corrosivo da maresia. Mas não se trata de um
cavaquinho, senão de uma de suas
alterações. O ukulele também tem quatro
cordas e descende do cavaquinho originário do Minho, no norte de Portugal, que foi
levado para o Havaí por emigrantes em 1879.
É comum de se ouvir na música tradicional havaiana, mas, depois de
descoberto pelos americanos é que o ukulele ganhou o mundo, chegando inclusive
ao Brasil pelas mãos e dedilhados de Jack Johnson ou, vindo de Liverpool, anos
antes, com a imagem dos ex-Beatles George Harrison e Paul McCartney, que
utilizou o instrumento no arranjo original de “Ram On” e até hoje homenageia
Harrison em seus shows com uma performance.
Juntar outros sons ao do instrumento de cordas beliscadas é ainda mais
contemporâneo, como mostra Beirut, orquestra
comandada por Zach
Condo, ao unir trompete e percussão em uma de suas músicas mais famosas:
Elephant Gun. E é isso que também tem feito a Blitz numa prova de renovação e atualidade.
Evandro não se separa do seu e, depois de sacá-lo numa improvisação,
defende-se para não ficar pra trás: “Era o que dava pra fazer de improviso no
meio da entrevista, mas desde que começamos a Blitz tem essa pegada meio praia
e que hoje se fala ‘meio
californiana”, diz.
Evandro e sua trupe continuam compondo e
prometem um novo disco de inéditas para o final deste ano. Até lá alguns
sucessos de outrora estão na boca dos fãs e registrados também num DVD que tem
lançamento previsto para agosto.
O show aberto ao público foi gravado em
dezembro passado no posto 8 da praia de Ipanema, bem perto de onde a banda
começou sua história: o antigo píer do Arpoador. O Instrumentista Rodrigo Sha,
o sambista Andrezinho e Ivo Meireles, que aparece acompanhado dos ritmistas da
escola Mangueira estão entre os convidados.
Eles participam da primeira comemoração
pela marca de três décadas, mas não devem ser vistos juntos em outros shows, já que a agenda
é longa. A turnê nacional da Blitz deve durar até o ano de 2015 graças ao
projeto aprovado pela Lei Rouanet de incentivo à cultura no valor de R$ 2,3
milhões. O suficiente para fazer – e lucrar bem - 30 apresentações a preço
populares.
Se não há participações especiais,
Evandro Mesquita se vira com o humor colocado em performances teatrais e falas
que são prontamente respondidas pelas backing vocals, entre elas a sua
companheira, Andrea Coutinho. E de teatro ele também entende. “Sou de uma época
em que uma peça de teatro mudava sua vida, não fazia só rir um pouco. Por isso
é que não gosto das apresentações vazias desses novos humoristas de stand-up.”
“Não gosto das apresentações vazias desses novos humoristas de stand-up.”
Depois da alfinetada, Evandro se
esquiva. Não entra em detalhes ou cita nomes, diferentemente do que faz com
políticos, alvos de suas piadas e chacotas e vários shows. Ao invés disso, o
ator que está há anos no mesmo “A Grande Família”, defende os precursores – ou os
primeiros a fazer esse tipo de comédia de cara limpa, importando dos Estados
Unidos - no Brasil.
“Eu gostava dos stand-ups que faziam o
Chico Anísio e o Jô Soares. Tem uma rapaziada jovem e de muito talento que está
contribuindo com uns lances bacanas, mas de algumas pessoas eu não gosto. Acho
que é assim em todos os lugares.”
Das boas iniciativas, Evandro só arrisca
uma – e que a essa altura talvez já seja um clichê, dada a incontestável vitória de construir o
maior canal brasileiro no YouTube, com mais de 3,5 milhões de inscritos.
Lançado em agosto de 2012, menos de um ano depois o Porta dos Fundos já ocupava
a 53ª posição em nível mundial e faturava em média a bagatela de R$ 60,1 mil
por mês, podendo atingir picos de 261 mil dólares, segundo o Social Blade. Idealizado
por Antonio Tabet, Fábio Porchat, Gregório
Duvivier, Ian SBF e João Vicente de Castro, o canal tem a proposta de produzir
dois vídeos por semana.
“O teatro pra mim é sagrado e o
stand-up é uma das formas de linguagem. Sei de uma galera que está conseguindo
coisas legais. A liberdade e a independência do pessoal da Porta dos Fundos é
um caminho sensacional. Eles conseguiram uma vitória ferrada sem nenhuma mídia
em televisão, sem nenhuma censura. Pra eles eu tiro meu chapéu”, disse.
Deles Evandro ainda não terminou sendo
vítima da Porta dos Fundos, mas foi de outros companheiros de humor. Tanto que
já confirmou, depois de ver algumas imitações, que poderia chamar Eri Johnson para
lhe socorrer em alguma apresentação da Blitz. Não dá pra dizer que o Eri Johnson cante, mas, de
fato, a imitação do sotaque exageradamente carioca zoa com qualquer boa fama e
pode ser tão divertida quanto.
Texto: Cristiano Félix
Fotos: Ramón Vasconcelos
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