Onde quer que procure sobre a moda atual, você há de ler: “os anos 90
estão de volta!”.
O que tanto se repete sobre a tendência, mas poucos parecem entender,
é que o que o novo clichê da temporada significa, pouco tem a ver com jeans
rasgados, flanela xadrez ou cabelos ensebados. Ou melhor, tem tudo a ver: mas
não do jeito que se imagina.
No mundo da moda é claro que o que dita às regras são as vendas. Mas
foram e são exatamente sobre elas que recai o que chamamos de moda (ou seria a
antimoda?) ‘grunge’.
Para entender o frisson estético da década rebelde (digo estético,
pois não se limitou às roupas - música, cinema e outros ícones comportamentais
encontraram-se todos dentro dessa camisa de flanela) é necessário, portanto,
voltar a história econômica dos EUA e mundial.
O fim dos anos 1980 trouxeram consigo um hiato melancólico para a
geração que viveria entre o fim das guerras, a recuperação de uma economia abalada
e o medo que viria no pós 11 de setembro de 2001. Àquela juventude sem
esperanças, ironicamente, seria concedido o direito de (voltar) a sonhar. E
viver, para além de uma cultura com os olhos voltados para a bolsa de valores.
Grunge significa, sobretudo, sujo. A estética dessa moda marginal
assumiu para si um protesto ‘anti-tudo’. Mais especificamente, ante todo o
establishment e brilho dos anos 80: ao contrário das gravatas e dos cabelos
engomados do jovem yuppie - young urban professional -, o ‘new look’ cresceria
de uma economia ainda em recuperação.
Esse jovem que, com a falta de empregos resultante da década anterior,
teria tempo de sobra para deixar o cabelo e a barba crescerem e faria dessa
desesperança um universo contracultural dos mais interessantes. E que embora
rico culturalmente, era bastante pobre financeiramente.
E daí, qual solução as vendas e a moda encontraria para vestir essa
gente?
Roupas de brechó eram baratas e atemporais (além de remeterem aos
clássicos, fossem beats, fossem cowboys, fosse o Elvis Presley). O minimalismo
cumpria uma questão funcional e os jeans, esses já estavam rasgados de velhos.
Os cabelos, sujos e longos, eram sinal de protesto e segundo alguns, de
preguiça - assim justificavam a falta de banho do Kurt Cobain. Mas não seria a
preguiça uma prima irmã da melancolia e ao mesmo tempo uma atitude ‘anti-atitude’?
Uma negação à disposição de produzir, tal qual exige o sistema capitalista?
Então, a cultura que não produzia estava repleta de muitas siglas
‘anti’. Eram anti-heróis como River Phoenix que se tornariam símbolo de
rebeldia, tal qual James Dean (sim, essa mesma moda que hoje revisita os 1990
para expressar uma economia mundial em crise já havia visitado os anos 1950 do
pós-guerra para lamentar uma juventude ‘perdida’ – consta que entre 1990 e 95
os EUA tiveram seu pior crescimento econômico desde o pós-guerra).
Foi assim também, pelas mãos de um jovem iniciante desinteressado em
produzir que a antimoda tomou as passarelas de alta costura. Alguém que faria
daquela piada não consumível algo consumado: Marc Jacobs. Sim, o mesmo
estilista que recentemente decidiu falar de bruxas-grunge ao invés de
princesas, após o casamento de Kate Middleton. Na mesma Inglaterra ‘pós-riots' juvenis.
Portanto, da próxima vez que você ler por aí
que “os anos 90 estão de volta” tente por
um segundo se esquecer daquele par de jeans rasgados e lembrar de um mundo e de
um sistema que começa a tentar se reerguer após uma grande crise econômica. Que
parece começar a perder o medo dos ataques terroristas - as tais novas guerras
do século XXI - e tente, quem sabe, sonhar.
Tente. Ainda que seja sem esperança, de um jeito um tanto quanto
melancólico e perdido. Mas que te permita pensar sobre um novo modelo de
sociedade, sobre uma nova juventude, e novos ícones para essa cultura. Eu já
escolhi meu novo James Dean. E você, vai sonhar com a nova princesa da
Inglaterra?
Texto: Thiago Pethit
Edição: Cristiano Félix
Foto: Giovanna Hackradt
Arte: André Soares
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